quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Portugueses pelo mundo - Aviação




Neste episódio do "Portugueses pelo Mundo", andamos pelo ar e conhecemos três portugueses que escolheram trabalhar em áreas ligadas a aviação na Europa e na América do Norte.

A viagem começa com o piloto da NATO Frederico Sousa, 37 anos, que vive em Heinsberg, na Alemanha. Enquanto nos guia pela base, fala-nos do seu percurso profissional, do trabalho na NATO e do funcionamento das missões. Convida-nos para acompanhar uma das missões em que está envolvido e, depois da missão, durante um passeio junto ao lago e pelo centro da cidade, apresenta-nos a família. A noite está reservada para um jantar de amigos, num restaurante português.
Da Alemanha seguimos para Filadélfia, nos Estados Unidos da América, onde Carlos Lopes, 36 anos, trabalha como comissário de bordo da American Airlines. Acompanhamos a saída de casa em direção ao aeroporto e a preparação de um voo para Boston. Com ele ficamos a conhecer uma antiga estação de comboios convertida em mercado, onde é possível encontrar comida e produtos do mundo, as Rocky Steps e a galeria de arte ao ar livre, Magic Gardens. Em dia do dérbi do Eagles contra o Dallas, assistimos ao jogo num bar, na companhia de amigos. 
É na Europa que continuamos a viagem e desta vez em Cambridge, em Inglaterra, onde Pedro Aguiar, 36 anos, trabalha para a Embraer, empresa fabricante de aviões. Guia-nos pelo hangar, onde se encontra o Legacy 500, um avião muito especial e na sua companhia disfrutamos de um passeio pelas ruas da cidade, sobre a qual descobrimos algumas curiosidades como os pointers, que navegam no rio e vão contando as histórias, como a árvore de Isaac Newton ou até das várias universidades, entre as quais a Kings College, a maior da cidade. Acompanhamos uma aula de cross-fit e um jantar num restaurante libanês, um dos seus preferidos.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Passageiros


O passageiro ou aquela coisinha simpática que vem agarrada ao Boarding Card. Esse mesmo. Este texto é para ti.

Aviação não era nada sem eles. Sabemos que a senhora de origem cabo-verdiana que limpa a casa de banho do aeroporto não trabalhava se não existisse o passageiro, que a Jordete que trabalha no aeroporto e comanda a porta de embarque como um general, só que com blush e salto alto, não trabalhava se ele não existisse, que o Comandante, aquela figura física de Deus era apenas um comum mortal se passageiros não existissem. Se não existisse, para quê cabineiras elegantes, TMAs, agentes de panca (rampa) ou catering, OCC Managers e toda panóplia de managers e deputies existentes nas diversas áreas de aviação, cujas siglas vão mudando de significado a par das tendências.

Posto isto, e já aqui referida a sua importância vital para o sector (sim, são vocês que nos pagam o ordenado), vamos lá falar de passageiros.

Tal como adoro cabineiros, não consegui excluir os passageiros deste rol de paixões fortes.

Adoro o passageiro bem disposto e educado, aquele que nos cumprimenta, que nos olha nos olhos. Adoro também o que entra a reclamar e que diz "Isto hoje em dia está cada vez pior", ou o que entra e que nos ignora. Este último pode ser porque se sente intimidado por nós e é apenas tímido (gosto de acreditar nisto) ou então é porque é apenas mal educado. Gosto daquela passageira atrevida que entra a meter-se com os comissários giros ou daquela que confessa logo ali à entrada que não está ali por opção. É a que tem pavor de voar.

Grande parte dos passageiros tem medo de voar. Percebemos isso de várias maneiras. São os que estão mais atentos ao que fazemos e dizemos nas fases mais críticas do voo. São aqueles que dão as mãos na descolagem aos parceiros ou aqueles que se benzem ao colocar o pé no avião. O direito, claro.

Adoro o passageiro brasuca bem disposto e aquele que julga que estamos lá para o servir. É cultural, malta.

Adoro aquele que pede tudo o que tem direito, pede água, café e coca-cola com gelo e limão. Repara que também existe sumo de tomate no carro. Também quer. Nem vale a pena perguntar se quer sal ou pimenta, óbvio que quer. E o stick também. Sem a cabineira ver, limpa os talheres e guarda-os na mala. Dão tanto jeito em casa. Pode sempre vender no OLX. COMO NÃO DÁ PARA LEVAR A MANTA?! Eu paguei! É minha! O colete também!

E aqueles passageiros que acham que o avião é a sua casa. Aqueles que cortam unhas, as pintam e até os que as elevam no banco da frente, as dos pés. Por que não.

O passageiro que mais gosto é aquele que fica tenso assim que o trolley (carrinho) de bebidas incluídas no bilhete se está a aproximar da sua fila. Esse passageiro já não se mexe quando está a duas filas de si, para de ler, ver filmes ou falar. Fica hirto e tenso, atento e com medo que a cabineira jovem se esqueça dele. Ele quer muito beber, só porque está incluído e ele tem esse direito. É um caso sério. Raramente este tipo de passageiro cumprimenta a tripulante. Está tão tenso que a cabineira não se atreve a esquecer dele, com medo que sofra um ataque cardíaco. Mas dá vontade. Assim que tem a bebida, os ombros relaxam e ele limita-se à pequenez da coisa.

O meu segundo preferido é aquele passageiro que adora aviação. Sabemos logo quem é, assim que entra a sorrir. É aquele que sabe o modelo do avião, a matrícula, sabe do novo modelo e do phase out de outro. É aquele que dá mais gosto agradar. É um tolinho que nos entende. Padece deste mal.

Adoro o passageiro que tem sempre um bom timing no que se refere a idas aos lavabos, pontos extra se for um avião com um corredor e no momento em que decorre o serviço.

Gosto do passageiro emigrante, do amor que sente pelo país, da alegria ao nos ver e ouvir. Muito respeito por este tipo de passageiro.

Adoro os passageiros pastinhas, os executivos altamente arrogantes e com inúmeros pertences caros. Ignoram em sofrimento que têm que respirar o mesmo ar que a plebe durante aquelas horas.

E aquela que não aceita ir apenas ao lavabo da classe que pagou? O de lá da frente é o dela, digam-lhe o que disserem. Não pagou Executiva, mas isso não interessa nada. Normalmente abre a cortina com muita atitude. Barreiras não são para esta senhora.

Adoro aquele que entra com a mala que excede as medidas, mala de mão, saco de duty free e casacão. Exige e reivindica a bagageira só para si. A hospedeira devia saber que ele pagou por ela. Miúda tola.

Gosto daquele que entende que isto de voar melhora com dois copinhos de vinho e gosto daquele que entendeu tão bem que até bebe do seu comprado no duty free. Não há cá limites para um verdadeiro liquid spirit. São os que acham que a cabineira não repara.

Adoro aquele que nos conta a vida toda e que só volta para o lugar quando o sinal de cintos se acende.

E aqueles que vão descalços aos lavabos?

Adoro o passageiro que dorme o voo todo e que ainda não se apercebeu que aterramos. Pode acontecer, se tomares e misturares coisas. Não julgamos.

Adoro os putos a pilhas, curiosos e sem medos. Os putos com as perguntas mais estapafúrdias. Os que nos dão desenhos e que querem ser como nós.

Adoro os passageiros velhinhos e simpáticos, que já não têm pressa. Exigem pouco e oferecem um sorriso e histórias doces.

Amo a magia de quem voa pela primeira vez. A alegria e nervosismo.

Adoro os que receiam mulheres nos comandos. "Daqui fala-vos a vossa comandante Beatriz" ainda é causador de cólica súbita.

Passageiros, tal como o nome indica, são passageiros, vão e vêm. Não ficamos sentidos. Entendemos. Preferimos quem nos trate bem e quem entenda que as vossas queixas são nos sobretudo alheias. Não decidimos a greve do ATC em França, nem o limite do espaço nas bagageiras, nem tão pouco tivemos influência no nevoeiro que causou o atraso. Sabemos que somos o rosto das vossas dores e que estamos sempre a ser julgados por vós. Nem sempre conseguimos ajudar e agradar todos.

Chegámos por agora ao fim, aterrámos ao som das palmas efusivas dos viajantes.

Ai...

Passageiros.